puxaste-me para os teus olhos
transparentes como o fundo do mar para os afogados. Depois, na rua,
ainda apanhámos o crepúsculo.
As luzes acendiam-se nos autocarros; um ar
diferente inundava a cidade. Sentei-me
nos degraus do cais, em silêncio.
Lembro-me do som dos teus passos,
uma respiração apressada, ou um princípio de lágrimas,
e a tua figura luminosa atravessando a praça
até desaparecer. Ainda ali fiquei algum tempo, isto é,
o tempo suficiente para me aperceber de que, sem estares ali,
continuavas ao meu lado. E ainda hoje me acompanha
essa doente sensação que
me deixaste como amada
recordação.
Nuno Júdice, "A Partilha dos Mitos"
Ontem li no jornal que a Drª Maria Barroso considera a poesia o cristal da literatura. Ao ler este poema nada faz sentido.
ResponderEliminarBoa semana, Paulo. (Estou a gostar muito de me refrescar aqui).
beijinho.
desculpa "nada faz mais sentido".
ResponderEliminarA propósito de um regresso:
ResponderEliminarOrigem do Império Português e do provincianismo português
Com estas esposas, mães, primas, irmãs,
Compreende-se.
Mal se viam chegando à puberdade,
Estes homens tinham de fugir
E seriam sedentos de quantas outras
Mulheres lhes dessem.
Os que ficavam, ou os que levavam consigo
As da família, que tinham,
Eram forçados pela tradição biológica
A viver no esófago das fêmeas,
Como o macho da bonelia viridis.
Que, em Portugal, até as putas são senhoras
Que não fazem porcarias,
E só ao sábado fodem e em decúbito dorsal.
in "Dedicácias"
Jorge de Sena